Após perder US$ 2 milhões (R$ 3,3 milhões) com a compra de ações no Brasil no fim dos anos 1990, o investidor Ned Smith Junior ingressou com recurso na Justiça na tentativa de obter os valores de volta junto às corretoras e bancos locais que fizeram as aplicações.
Mas Ned não apenas perdeu a causa no Superior Tribunal de Justiça (STJ) - instância máxima para julgar esse tipo de questão no Judiciário - como seu processo marcou um entendimento importante do tribunal a respeito de quais investidores podem pedir ressarcimento por prejuízos em aplicações financeiras.
O STJ fez uma diferenciação entre dois tipos de investidores: os habituais e os esporádicos. Os primeiros são aqueles que atuam diariamente no mercado e operam com risco. Os segundos são os que possuem poucas aplicações que não contêm grandes riscos como CDBs e fundos DIs.
"O grande investidor ou investidor habitual conhece o negócio, acompanha o mercado, sabe os riscos que corre", afirmou ao Valor o ministro Sidnei Beneti, relator do caso. Esse investidor "profissional" teria menos chances de vencer ações na Justiça em caso de perdas no mercado financeiro pois é visto como alguém que monitora o mercado e faz aplicações quase diariamente com a percepção de possíveis prejuízos.
"Já o investidor episódico, que aplica em fundos DI e CDBs, é diferente", completou o ministro. Nessa visão, o investidor de CDBs não seria um profissional, mas apenas alguém que aplica seus recursos em intervalos de tempo maiores. Esse investidor teria mais chances de ser protegido pela Justiça, caso perca quantias por má administração de bancos e corretoras, pois é considerado mais vulnerável à atuação dos administradores.
No caso, que foi julgado pela 3ª Turma do STJ, Ned foi incluído na cota dos investidores habituais. "Ele é um grande investidor", constatou Beneti. Na avaliação do ministro, o "investidor (Ned) é homem de empresa que os autos (do processo) mostram experiente, com propriedade imóvel".
De acordo com o processo, Ned possui uma empresa, a Dryford Investment, que também pediu ressarcimento pelas perdas aos bancos e corretoras. O investidor e a sua empresa chegaram a ganhar a causa no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A Corte gaúcha concordou com a tese de que o dinheiro teria sido mal aplicado e determinou a devolução dos US$ 2 milhões investidos em compras de ações no Brasil. Mas os bancos e as corretoras recorreram ao STJ.
Inicialmente, o caso chamou a atenção dos ministros do STJ por causa de falhas processuais. Primeiro, foi constatado que a Dryford não fez o depósito de uma caução, obrigação fixada para empresas estrangeiras que ingressam no Judiciário brasileiro. Em seguida, para se livrar da caução, a Dryford cedeu os seus direitos da ação para a pessoa física de seu presidente, Ned.
Para completar, mesmo com a condição de empresário e com pelo menos US$ 2 milhões investidos, Ned pediu assistência jurídica gratuita. Ou seja, ele queria que o Estado pagasse pelos serviços jurídicos em seu processo. A alegação foi a de que, com o prejuízo, Ned teria se tornado "hipossuficiente" a ponto de não poder arcar com as custas processuais e honorários advocatícios, caso perdesse a ação, sem prejudicar o sustento de sua família.
O pedido foi rechaçado pelo STJ. Os ministros Massami Uyeda, Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino e Vasco Della Giustina concordaram com Beneti na tese de que, dono de empresa e de imóvel, o investidor jamais poderia ser beneficiado com assistência jurídica gratuita e tampouco deveria ser indenizado por aplicações e que se submeteu com condições de saber o risco de eventual perda de dinheiro. Ao fim, a decisão foi unânime.
O Valor entrou em contato com o escritório de advocacia que representou Ned no STJ, mas não obteve retorno.
VALOR ECONÔMICO - INVESTIMENTOS
Juliano Basile - De Brasília
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